quinta-feira

a caminho

Já era praxe, mas ainda ardia toda vez que ela adiava a tal conversa.
Ele derramava versos, de amor, sempre. Às vezes rancor também.
Já viu vir um, sem o outro?

Esqueço que amar é quase...
... é quase sexo, mas sem carne.

Há dias não pensava em outra coisa, nem em todas as outras coisas, que pairam por aí sem o perfume muito da uma moça, e só dela moça mesma; mesmo, ímpar.

Aguardava (aguardavam?) espremido de ansiedade o dia que era o tal. De perdões, confissões e, tudo caminhando segundo um sonho, conclusões.

Não uma dessas que se concluem e findam. Essa não! A outra.
Não "a outra", aquela uma, daquela noite. Essa não! Ela.

Longas foram as noites que passaram sem ela, e aí veio o dia. Sempre vem, né?

Custou, mas veio. Veio, mas não direto.
Indireto, mas indescritivelmente certo.
Sem falhas, sem equívocos, sem pressa, prá não perder a deixa.
Sem melodia, sem palavra, prá não perder o valor.

Valeu? Valeu.
Deixar não deixou, mas não perdeu a deixa, e isso bastou.

Uma linha invisível que ainda anda tesa, tensa, suspendendo o infinito num beijo.

Telônios

terça-feira

Publiciverso III

A Araruna pia, de dentro,
do fundo mato
Arrepia os desavisados com seu entoar
azul, suingado.

Papa-Capim, ali passava,
disparou a pensar
Só escutando,
Araruna cantando.

Da mesma exata maneira, cada um
quando passava por ali, esbarrava de vagar
e divagava longe, na mente

Matando as saudades dos distantes
Que logo apareciam para apreciar.
E ali foi juntando gente, e gente

Eram dois, dez, dez milhões
de repente a dançar
Idos, vividos e as crianças...
Juntos!
e a alegria.

Telônios

Publiciverso IV

Era fim de junho.
Um menino, muito do pobrinho, choramingava lá no canto, vendo a lenha da fogueira de São João se queimar.
Para ele ali, naquela hora, nada era nada. Não ouvia foguete, não lia bilhete.

Era a última quermesse, e ela... continuava longe. Toda sorrisos do outro lado do pátio. Ele: lágrimas; e olhos.

O rapazinho tanto chorou que conseguiun até o que não queria: fez chover! Arruinou-se fogueira, quadrilha e noite dos mais bestas, que se deixaram impressionar pela garoa gorda.

Quem ficou viu, mas não pode contar. Nunca achavam palavras que bastassem para tanto espanto: o menino brilhava de luz, e a chuva que caía nele se derramava no chão. E eram gotas de prata pura!

Foi um milagre! Ou, quem sabe, alguma coisa que puseram no quentão...

Telônios

Publiciverso V

Batia seu pilão
Morena-azul bela e triste;
recortada contra o mar-azul
sem fim

Batia no pilão a raspa
da última saca de farinha de milho
prá fazer boa cachupa.

Primeiro as crianças,
também então os mais véin
e até a cabrita.
A fome levou tudo.

Na praia pilava farinha,
na praia choravam sozinhas,
muita mucama bonita...

E socaram e socaram o pó
mesmo pó em que semearam,
até cada pilão e cada mulher
estar afundada na terra.

Pipocaram só
no meio dos desertos
fagulhas na farinha massetada: ouro puro!

Telônios

Publiciverso VI

Vó véia largou
a panela lá, na cozinha
e foi ouvindo:

O afã do fandango
próximo, logo ali...

Sua colher de pau
sobrinha predileta
de fogo de lenha

Amiga antiga
das panela todas

já nem se reconhecia
estalando batucada batendo
contra o ferro quente

Vó véia pegou
na panela lá, na cozinha
e foi batucando...

Telônios

Publiciverso II

Bate zabumba
Bate bumbo
Ganga zumba
tem saudade

Na melodia da museta
Nostalgia se escorre
mais um dia que se morre
prá noite ir até mais tarde

Bate um
Outra rebate
Batmacumba baticum
é no instante que se faz a arte"

Publiciverso I

Bate zabumba, bate moringa
o espírito tem sede
Ganga zumba e Rainha Jinga
nas carnes, tem vontades.

Na gorda garganta
da larga corneta
até o bode endireita os cornos
prá ouvir o que se passa

é o vento que sopra
vindo do pulmão
no momento exato
sussurra um trovão

o guincho não é de graça
faz muita parte:
e apito é bonito, até...
da chalaça brota arte

Telônios